Carta de Edouard Carmignac

Caros investidores,

Parece que os mercados acionistas estão a desafiar a gravidade. As tensões tarifárias, os conflitos no Médio Oriente e na Ucrânia e a incerteza em torno da situação política em França não abrandaram a subida constante dos mercados bolsistas, à medida que a volatilidade foi diminuindo.

É verdade que o contexto é favorável e é provável que assim continue. Para além da continuação das políticas fiscais bastante acomodatícias, as taxas de juro estão a baixar em todo o mundo, facilitadas pelo abrandamento das pressões inflacionistas. No entanto, estas condições auspiciosas não podem, por si só, justificar as valorizações em flecha.

Na nossa opinião, a explicação reside na enorme aceleração tecnológica a que estamos a assistir. Nunca em toda a História da humanidade tivemos tantos progressos ao nosso alcance. Na sequência da revolução da Internet dos anos 90, que permitiu a difusão ilimitada e imediata do conhecimento, a Inteligência Aumentada – incorretamente designada por “artificial” – vai permitir-nos progredir a um ritmo que ainda não podemos imaginar, em domínios cujo alcance ainda não podemos medir. A IA já nos está a libertar de tarefas morosas, como a compilação de dados e a redação de correspondência de rotina. Neste sentido, é um fator importante para melhorar a produtividade e estimular a criatividade. Além disso, tornou-se um valioso motor de investigação, tanto no domínio da física como da biotecnologia, tendo mesmo alguns Prémios Nobel entre os seus utilizadores. A esperança de vida de 120-150 anos, que pode ter parecido um sonho impossível há uma década, parece agora plausível. O desenvolvimento da tecnologia de fusão, em curso há mais de 50 anos, permitirá a proliferação de energia barata. Isto poderia acontecer antes de 2035, em vez do prazo previsto de 2050. E no domínio da defesa, a IA permite combater com enxames de drones avançados e imaginar aviões de combate sem pilotos humanos.

Seria inútil tentar prever o alcance da revolução em curso. O que é certo, porém, é que a sua implementação está a acelerar, possibilitada pela explosão de centros de dados em todo o mundo. Sem dúvida que a valorização das ações de IA é uma questão delicada e propensa a um entusiasmo temporário excessivo. Mas estamos apenas no início de um grande arranque tecnológico que temos de antecipar e analisar o melhor possível. Para os investidores, isto implica identificar quem ganha e quem perde nesta convulsão global.

Comparados com esta mudança de paradigma, os jogos políticos parecem triviais. As trocas de palavras entre Donald Trump e Xi Jinping fazem lembrar o jogo infantil francês «la barbichette», em que cada jogador segura o queixo do outro numa tentativa de fazer com que o adversário pestaneje primeiro. Na batalha entre os Estados Unidos e a China, um detém o trunfo fundamental dos semicondutores de alta qualidade e, o outro, as terras raras, essenciais para o desenvolvimento de produtos tecnológicos. Estão condenados a chegar a acordo. Quanto à lamentável encenação política francesa, não se tem em conta o poderoso sinal de alerta que os mercados, mais cedo ou mais tarde, vão dar.

Saudações calorosas,